(2009) Corpos em evidência

Confortáveis com seus quilinhos extras, Carina Porto, Guta Gonçalves, Simone Gutierrez e Rafaela Ferreira mostram que são mais do que rostinhos fofinhos e engraçadinhos. São atrizes que encaram qualquer papel. As quatro se reuniram para o bate-papo que acabou virando uma mesa-redonda sobre as dificuldades de não se encaixar nos padrões e no mercado. As experiências e histórias relatadas comprovam que não é fácil se destacar num meio onde cada polegada (a menos) vale ouro, mas também mostram que com talento e autoestima se chega longe.

Resolvida


Rafaela é Juju em "Malhação ID", nova fase do seriado teen. Vinda do teatro, a menina de 20 anos nunca se preocupou em agradar ninguém e acabou ganhando o papel: "Minha personagem não foi escrita para uma menina gorda, não era para levantar bandeira. Inclusive, a gordinha da trama é a Rita (Olívia Torres), que usa enchimento. Isso é a prova de que não é preciso ser magra e anoréxica para entrar na TV, basta ter talento", diz a atriz, com a segurança de seu 1,63m, 75kg e sete anos de carreira.
Já Simone Gutierrez, sucesso no teatro como a bem-resolvida Tracy do musical "Hairspray", dá vida à Amélia, a mãe zelosa de um rapaz gay no humorístico "Zorra total". "Eu sempre briguei muito com a balança porque fiz balé a vida inteira e queria ser como as outras. Mas quando fui chamada para o musical relaxei. Agora vou aproveitar", desabafa Simone, que depois de engordar 15kg (hoje ela pesa 69kg) acha que vai ser difícil encontrar outros bons papéis para mulheres acima do peso em musicais. "A Tracy é a única heroína gorda que conheço. Em novela é mais tranquilo, mas mesmo assim já perdi muito trabalho por não me encaixar nos padrões", reclama a baixinha atriz de 33 anos.


Rótulos

Simone acredita que os chamados "núcleos cômicos" das produções brasileiras de teledramaturgia sobram para os atores que estão bem acima do peso, que sempre encarnam personagens atrapalhados, engraçados ou bonachões. Rafaela concorda, em parte: "A Juju está no núcleo cômico de ´Malhação ID´, mas a intenção é mostrar que qualquer um pode se sentir bem com seu corpo e seu jeito".


Ricardo Hofstetter, autor da novela, faz coro com sua atriz. "Acho que as gordinhas sempre tiveram seu espaço na TV. Na vida real, elas estão por aí, muitas delas charmosérrimas e lindas. Como a TV é um espelho da realidade, sempre haverá lugar para elas".


Preconceito

Mas a verdade é que, por enquanto, a maioria destes personagens acaba sofrendo o mesmo tipo de preconceito que os gordos costumam sentir do outro lado da câmera. Na novela "Caras & bocas", Ísis, personagem de Carina Porto, é alvo de agressões até dentro de casa. Ela é chamada de gorda até por quem é apaixonada, o advogado Galeno (Pedro Garcia Netto). Mas no fim da trama, a moça será disputada por dois rapazes.
"A Ísis é ofendida o tempo todo, mas quando Dino (Diego Cristo), o borracheiro, começar a olhar para ela, Galeno também vai se interessar. E isso vai ser legal, porque mostra que não é apenas a estética que conta, mas a inteligência também", revela Carina.
"A Ísis sempre questionou o fato de um cara tão inteligente como o Galeno ser tão interessado na beleza e não se importar com o resto. Eu mesma sempre desconfiei desse tipo de atitude", revela Carina.


Guta Gonçalves, de 16 anos, a Débora de "Cama de gato", tem história parecida. "Sempre escuto em festas de família, ou daquele amigo da mãe um "você engordou, né?". É chato porque não sou anormal. Você passeia no Projac e acha que todo mundo é lindo, mas isso não é a realidade. Comer é prazer, gente!", defende a jovem, do alto do seu 1,54m e dos seus 57kg.


Na trama, Débora é filha de Alcino (Carmo Dalla Vecchia) com uma fotógrafa muito sofisticada, Leda (Ana Cecilia Costa), que vive implicando com a forma física da adolescente.


Mesmo com toda a insegurança inevitável que acomete as jovens de sua idade, Guta jura não se abalar com o que pensam dela, e garante nunca ter tido dificuldade em arrumar namorado: "Gordinha não pega geral porque normalmente o cara se apaixona logo. Como ele não está ligado só na beleza, acaba se encantando com sua verdadeira personalidade. Se fosse para desfilar com um troféu, ele procuraria uma modelo", filosofa.


Carina, hoje com 26 anos, conta que na escola sempre se destacou e nunca foi excluída por ser mais cheinha que suas amigas. Mas confessa que tentou de tudo nessa vida para enxugar a silhueta voluptuosa. "Fiz a dieta da sopa, do arroz, da maçã, da Lua... Nossa, perdi a conta de quantas maluquices já fiz".


Autor de "Caras & bocas", Walcyr Carrasco acredita que, apesar de o talento ser o mais importante, não dá para ser hipócrita e fingir que a sociedade deixa de lado as aparências. "Uma boa atriz poderá fazer qualquer papel, mas é preciso lembrar que a novela reflete a realidade. Uma atriz gorda será vista como gorda pelo espectador. Pode até pedir para nunca ser chamada de gorda em cena, mas isso não muda a realidade. Mas muitos homens preferem as mulheres ´com recheio´", sentencia.


Fofinhas em série

Na televisão americana os personagens fora dos padrões também têm ganhado destaque. No país onde 25% da população é considerada obesa, nada mais natural que a população queira se ver retratada nas telas. É só dar uma olhada na série que se tornou atual febre, o musical "Glee".


Uma das personagens mais carismáticas é Mercedes, interpretada pela atriz Amanda Riley. Ela e seus desajustados amigos fazem parte do grupo de coral da escola e cantando eles exorcizam suas questões - a trilha sonora já é hit na internet. No Brasil, a atração estreou este mês, na Fox.


Na mesma época, outro fenômeno de audiência americana chegou por aqui no canal Sony: trata-se da comédia "Drop dead diva". Jane Bingum (Brooke Elliott) é uma advogada bem acima do peso e insegura, que vê sua vida ser transformada quando o espírito da modelo Deb (Brooke D´Orsay), uma loira fútil e burra, reencarna em seu corpo. Deb fica desesperada ao perceber que agora habita um corpo cheio de formas arredondadas e "obriga" Jane a adotar uma dieta mais saudável e a se preocupar mais com a aparência.
Em "Betty, a feia", Betty Suarez (America Ferrera) é uma assistente de uma importante revista de moda, a "Mode". Por conta de muito talento e habilidade para resolver todos os problemas do chefe bonitão, Daniel (Eric Mabius), ela acaba sendo promovida. E Betty não sofre como a versão original, colombiana, que vivia chorando atrás de um amor platônico. Na série, a heroína é disputada. A cada temporada - no Brasil está na terceira, no Sony - são pelos menos dois aos seus pés.


Menos conformada com a aparência, Kristie Alley há muito deixou de ser a loira arrasa quarteirão do filme "Olha quem está falando". Kristie fechou os anos 90 com alguns quilos a mais e em 2005, cansada de ser alvo de piadinhas infames, resolveu tirar proveito de sua nova condição com a série "Fat actress" ("atriz gorda").


O programa era um misto de realidade e ficção que contava a história de uma atriz que luta para emagrecer e reviver seus dias de glamour. A atração fez sucesso. No fim da sétima temporada, a atriz até chegou a emagrecer, mas logo recuperou os 34kg perdidos.

Fonte: Diário do Nordeste


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